Revolvem-se os folhos
de um vestido de pano
numa boneca de pano-encantado,
feito de trapos,
remendado,
com emendas sucessivas,
impostas pela sucessão dos dias.
Revolvem-se as cores
que se foram gastando com o tempo,
como o foram o brilho do seu sorriso fingido,
a beleza do seu velho vestido
e as suas mãos, que se tornaram frias.
Dir-se-ia tratar-se de uma boneca condenada
com a raiva de viver em sorrisos ocultada.
Dir-se-ia ser uma imagem da apatia
de uma boneca de vida vazia.
E tudo o que se diga não vai chegar
porque se está a falar
de uma boneca que queria revestir-se
não de pano mas de mar.
São os sonhos que a mantêm
numa prateleira à espera
de dias compridos
em que o Sol a deixe falar com os deuses
que seus mitos possam cristalizar.
São os sonhos que lhe revolvem os folhos
debotados pelo tic-tac contínuo
do livro onde sem querer
esta boneca de encantado-pano acabou por entrar.
São os sonhos
que admitem remendos no vestido,
no seu corpo,
no seu corpo desde sempre remendado.
São os sonhos
e a imagem de um mundo
também ele encantado.de um vestido de pano
numa boneca de pano-encantado,
feito de trapos,
remendado,
com emendas sucessivas,
impostas pela sucessão dos dias.
Revolvem-se as cores
que se foram gastando com o tempo,
como o foram o brilho do seu sorriso fingido,
a beleza do seu velho vestido
e as suas mãos, que se tornaram frias.
Dir-se-ia tratar-se de uma boneca condenada
com a raiva de viver em sorrisos ocultada.
Dir-se-ia ser uma imagem da apatia
de uma boneca de vida vazia.
E tudo o que se diga não vai chegar
porque se está a falar
de uma boneca que queria revestir-se
não de pano mas de mar.
São os sonhos que a mantêm
numa prateleira à espera
de dias compridos
em que o Sol a deixe falar com os deuses
que seus mitos possam cristalizar.
São os sonhos que lhe revolvem os folhos
debotados pelo tic-tac contínuo
do livro onde sem querer
esta boneca de encantado-pano acabou por entrar.
São os sonhos
que admitem remendos no vestido,
no seu corpo,
no seu corpo desde sempre remendado.
São os sonhos
e a imagem de um mundo
Carmen Zita Ferreira
in Jogo de Espelhos, Ed. Som da Tinta, 2004
3 comentários:
Revolvem-se as palavras
de uma alma de sonho
numa vida de tanto sentido,
feita de momentos,
construíndo,
com etapas sucessivas,
declaradas pela necessidade dos dias.
Revolvem-se as dores
que se foram devastando ao longo das praias,
como o foram os grandes areais
na dura batalha contra o mar.
Dir-se-ia tratar-se de uma boneca vitoriosa
com os trajes de festa engalanando toda a sua vida.
Eu diria que és a imagem forte da vitória em pessoa.
Obviamente que ADORO o teu poema. E a foto...linda!
Um beijinho grande.
Bem, Su, muito obrigada pelo teu comentário.
Parece mesmo a continuação de um tema escrito ao longo de 5 anos (estes poemas da boneca de pano-encantado foram escritos no dia 21 de Janeiro, durante 5 anos, nos idos anos 90).
Muito muda em 10 anos e ainda bem.
Grande e apertado abraço para ti.
Faz de conta que é uma espécie de ponte...ou curva acentuada do arco-íris...que estejas agora na fase do "pote de ouro"! ;)
Beijinhos bem grandes.
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