30 dezembro 2010
tudo para a rua e é já
Anda, desliga o cabo,
que liga a vida, a esse jogo,
joga comigo, um jogo novo,
com duas vidas, um contra o outro.
Já não basta,
esta luta contra o tempo,
este tempo que perdemos,
a tentar vencer alguém.
Ao fim ao cabo,
o que é dado como um ganho,
vai-se a ver desperdiçamos,
sem nada dar a ninguém.
Anda, faz uma pausa,
encosta o carro,
sai da corrida,
larga essa guerra,
que a tua meta,
está deste lado,
da tua vida.
Muda de nível,
sai do estado invisível,
põe o modo compatível,
com a minha condição,
que a tua vida,
é real e repetida,
dá-te mais que o impossível,
se me deres a tua mão.
Sai de casa e vem comigo para a rua,
vem, q'essa vida que tens,
por mais vidas que tu ganhes,
é a tua que,
mais perde se não vens.
Anda, mostra o que vales,
tu nesse jogo,
vales tão pouco,
troca de vício,
por outro novo,
que o desafio,
é corpo a corpo.
Escolhe a arma,
a estratégia que não falhe,
o lado forte da batalha,
põe no máximo o poder.
Dou-te a vantagem, tu com tudo, eu sem nada,
que mesmo assim, desarmada, vou-te ensinar a perder.
Sai de casa e vem comigo para a rua,
vem, q'essa vida que tens,
por mais vidas que tu ganhes,
é a tua que,
mais perde se não vens.
28 dezembro 2010
sem especificar lá muito bem...
Quando eu nascer vou ser do bem
Quando eu quiser vou ser alguém
Vou me libertar largando o chão
Para poder subir ao meu verão
Então, meu bem, vou ser alguém
Quando eu nascer vais ver, meu bem
Quem me encontrar vai querer sorrir
Quem me descobrir vai querer ficar
Vou fazer feliz o mundo vão
Então, meu bem, vou ser alguém
Meu sopro aquece a água fria
Meu nome para abraçar o dia
27 dezembro 2010
absolute irony
Vês que estás velho quando o que há de mais rebelde em ti são os primeiros cabelos brancos.
26 dezembro 2010
24 dezembro 2010
Natal chique
Percorro o dia, que esmorece
Nas ruas cheias de rumor;
Minha alma vã desaparece
Na minha pressa e pouco amor.
Hoje é Natal; Comprei um anjo,
Dos que anunciam no jornal;
Mas houve um etéreo desarranjo
E o efeito em casa saiu mal.
Valeu-me um príncipe esfarrapado
A quem dão coroas no meio disto,
Um moço doente, desanimado…
Só esse pobre me pareceu Cristo.
Vitorino Nemésio
In “Primeiro livro de poesia”
2.ª ed, Ed. Caminho, 1993, pg.79
Nas ruas cheias de rumor;
Minha alma vã desaparece
Na minha pressa e pouco amor.
Hoje é Natal; Comprei um anjo,
Dos que anunciam no jornal;
Mas houve um etéreo desarranjo
E o efeito em casa saiu mal.
Valeu-me um príncipe esfarrapado
A quem dão coroas no meio disto,
Um moço doente, desanimado…
Só esse pobre me pareceu Cristo.
Vitorino Nemésio
In “Primeiro livro de poesia”
2.ª ed, Ed. Caminho, 1993, pg.79
23 dezembro 2010
21 dezembro 2010
16 dezembro 2010
15 dezembro 2010
a arte do desvio 1#
ou
todos os dias passo tão perto…
Há, na viagem que tenho feito, umas curvas especiais.
Apercebi-me disso há uns dias quando, pela terceira vez, ouvi a mesma música ao passar por elas e pensei na minha morte.
Ontem, para me certificar de que não me aconteceria o mesmo pela quarta vez, seleccionei a rádio e ouvi outra música; no entanto pensei na mesma que, naquelas curvas, é possível que possa, um dia (uma noite) morrer.
Como quando regresso a casa a essa hora toda a senda me parece igual e raramente me lembro do caminho que fiz, ontem quis identificar melhor onde estão essas curvas especiais:
Estão perto do corte para a terra natal do meu avô João.
Sou mocinha para me deixar tocar por todas estas coincidências. Mas, ultimamente, ando a praticar a arte do desvio.
todos os dias passo tão perto…
Há, na viagem que tenho feito, umas curvas especiais.
Apercebi-me disso há uns dias quando, pela terceira vez, ouvi a mesma música ao passar por elas e pensei na minha morte.
Ontem, para me certificar de que não me aconteceria o mesmo pela quarta vez, seleccionei a rádio e ouvi outra música; no entanto pensei na mesma que, naquelas curvas, é possível que possa, um dia (uma noite) morrer.
Como quando regresso a casa a essa hora toda a senda me parece igual e raramente me lembro do caminho que fiz, ontem quis identificar melhor onde estão essas curvas especiais:
Estão perto do corte para a terra natal do meu avô João.
Sou mocinha para me deixar tocar por todas estas coincidências. Mas, ultimamente, ando a praticar a arte do desvio.
oxalá o meu futuro aconteça
Oxalá, me passe a dôr de cabeça, oxalá
Oxalá, o passo não me esmoreça;
Oxalá, o Carnaval aconteça, oxalá,
Oxalá, o povo nunca se esqueça;
Oxalá, eu não ande sem cuidado,
Oxalá eu não passe um mau bocado;
Oxalá, eu não faça tudo à pressa,
Oxalá, meu futuro aconteça
Oxalá, que a vida me corra bem, oxalá
Oxalá, que a tua vida também;
Oxalá, o Carnaval aconteça, oxalá
Oxalá, o povo nunca se esqueça;
Oxalá, o tempo passe, hora a hora,
Oxalá, que ninguém se vá embora,
Oxalá, se aproxime o Carnaval,
Oxalá, tudo corra, menos mal.
(Madredeus)
Oxalá, o passo não me esmoreça;
Oxalá, o Carnaval aconteça, oxalá,
Oxalá, o povo nunca se esqueça;
Oxalá, eu não ande sem cuidado,
Oxalá eu não passe um mau bocado;
Oxalá, eu não faça tudo à pressa,
Oxalá, meu futuro aconteça
Oxalá, que a vida me corra bem, oxalá
Oxalá, que a tua vida também;
Oxalá, o Carnaval aconteça, oxalá
Oxalá, o povo nunca se esqueça;
Oxalá, o tempo passe, hora a hora,
Oxalá, que ninguém se vá embora,
Oxalá, se aproxime o Carnaval,
Oxalá, tudo corra, menos mal.
(Madredeus)
12 dezembro 2010
oxalá
A arte já sabemos nasce
da imperfeição das coisas
que trazemos para casa
com o pó da rua
quando a tarde finda
e não temos água quente
para lavar a cabeça.
Tentamos regular
com açudes de orações
o curso da tristeza
mudamos de cadeira
e levamos a noite
a dizer oxalá
como se a palavra
praticasse anestesia.
José Miguel Silva
Ulisses já não mora aqui
& etc.
da imperfeição das coisas
que trazemos para casa
com o pó da rua
quando a tarde finda
e não temos água quente
para lavar a cabeça.
Tentamos regular
com açudes de orações
o curso da tristeza
mudamos de cadeira
e levamos a noite
a dizer oxalá
como se a palavra
praticasse anestesia.
José Miguel Silva
Ulisses já não mora aqui
& etc.
10 dezembro 2010
09 dezembro 2010
os livros e as ilusões 3#
“(…) era uma daquelas raras pessoas em que a mente acaba por vencer sobre a matéria. A idade não diminui essas pessoas. Torna-as velhas, mas não altera as pessoas que elas são e quanto mais tempo vivem, mais radicalmente e implacavelmente se encarnam a si mesmas.”
Paul Auster
O livro das ilusões. 4.ª ed, Lisboa, Ed Asa,
2006, pg. 196
O livro das ilusões. 4.ª ed, Lisboa, Ed Asa,
2006, pg. 196
Quisera que me entendesses sem palavras.
Falar-te sem palavras, como se fala à minha gente.
Que a mim me entendesses sem palavras
como eu entendo o mar ou a brisa enlaçada num álamo verde.
Perguntas-me, amigo, e não sei responder-te;
há muito que aprendi fundas razões que não entendes.
Revelá-las quisera, pondo o sol invisível em meus olhos,
a paixão com que a terra doura seus frutos ardentes.
Perguntas-me, amigo, e não sei a resposta que hei-de dar-te.
Sinto arder louca alegria nesta luz que me envolve.
Quisera que a sentisses também a inundar-te a alma,
quisera que a ti, no mais fundo, também te queimasse e te ferisse.
Criatura também de alegria eu quisera que fosses,
criatura que chega por fim a vencer a tristeza e a morte.
Se agora eu te dissesse que havia de andar por cidades perdidas
e chorar em suas ruas escuras por se sentir débil,
e cantar sob uma árvore de estio os teus sonhos sombrios,
e sentir-te feito de ar e nuvem e erva muito verde...
Se agora eu te dissesse
que é tua vida essa rocha em que as ondas se quebram,
a própria flor que vibra e se enche de azul sob o claro nordeste,
aquele homem que vai pelo campo nocturno com uma tocha,
o menino que açoita o mar com a mão inocente...
Se eu te dissesse, meu amigo, estas coisas,
que fogo porias em minha boca, que ferro incandescente,
que odores, cores, sabores, contactos, rumores?
E como saber se me entendes?
Como entrar em tua alma, quebrando o seu gelo?
Como fazer-te sentir a morte vencida para sempre?
Como penetrar em teu inverno, levar o luar à tua noite,
Pôr em tua escura tristeza labaredas celestes?
Sem palavras, amigo; tinha que ser sem palavras
para tu me entenderes.
José Hierro
(1922-2002)
Tradução de José Bento
Falar-te sem palavras, como se fala à minha gente.
Que a mim me entendesses sem palavras
como eu entendo o mar ou a brisa enlaçada num álamo verde.
Perguntas-me, amigo, e não sei responder-te;
há muito que aprendi fundas razões que não entendes.
Revelá-las quisera, pondo o sol invisível em meus olhos,
a paixão com que a terra doura seus frutos ardentes.
Perguntas-me, amigo, e não sei a resposta que hei-de dar-te.
Sinto arder louca alegria nesta luz que me envolve.
Quisera que a sentisses também a inundar-te a alma,
quisera que a ti, no mais fundo, também te queimasse e te ferisse.
Criatura também de alegria eu quisera que fosses,
criatura que chega por fim a vencer a tristeza e a morte.
Se agora eu te dissesse que havia de andar por cidades perdidas
e chorar em suas ruas escuras por se sentir débil,
e cantar sob uma árvore de estio os teus sonhos sombrios,
e sentir-te feito de ar e nuvem e erva muito verde...
Se agora eu te dissesse
que é tua vida essa rocha em que as ondas se quebram,
a própria flor que vibra e se enche de azul sob o claro nordeste,
aquele homem que vai pelo campo nocturno com uma tocha,
o menino que açoita o mar com a mão inocente...
Se eu te dissesse, meu amigo, estas coisas,
que fogo porias em minha boca, que ferro incandescente,
que odores, cores, sabores, contactos, rumores?
E como saber se me entendes?
Como entrar em tua alma, quebrando o seu gelo?
Como fazer-te sentir a morte vencida para sempre?
Como penetrar em teu inverno, levar o luar à tua noite,
Pôr em tua escura tristeza labaredas celestes?
Sem palavras, amigo; tinha que ser sem palavras
para tu me entenderes.
José Hierro
(1922-2002)
Tradução de José Bento
08 dezembro 2010
arte poética
"Na minha opinião, um poema opõe-se a uma obra de ciência por ter como seu objectivo imediato o prazer e não a verdade; opõe-se ao romance, por ter por seu objecto um prazer indefinido em vez de definido, sendo poema apenas e quando esse objectivo é alcançado."
Edgar Allan Poe
"Poética"
Lisboa, Ed. Fundação Calouste Gunbenkian, 2004, pg.26
01 dezembro 2010
Banda sonora de viagem 4#
Só mais uma volta
Só mais uma volta a mim
Só mais uma volta desta ninguém vai cair
Só mais uma vez que vês que ninguém está aqui
Queres só mais uma volta desta ninguém vai cair
Tempo frio afasta o tempo que nos afastou
Primavera lança o laço que nos amarrou
Tempo quente dá vontade de não resistir
Vai só mais uma volta desta ninguém vai cair
E ainda te sinto a seguir o rasto que deixo a correr
Ainda penso em ti... pensa em mim, mas só mais uma vez.
Diz-me ao que queres jogar que eu vou querer também
Diz-me quanto queres de mim para te sentires bem
Não te vejo bem ao longe não sei distinguir
Queres só mais uma volta e desta ninguém vai cair
Ainda te sinto a seguir o rasto que deixo a correr
Ainda penso em ti... pensa em mim, mas só mais uma vez.
Diz-me quanto tens de honesto quanto tens de bom
Diz-me quantas provas queres diz-me quanto sou
Já não sinto nada dentro não sei perceber...
Vai só mais uma volta, desta ninguém vai dizer.
Ainda te sinto a seguir o rasto que deixo a correr
Ainda penso em ti... pensa em mim, mas só mais uma vez.
Só mais uma volta a mim
Só mais uma volta desta ninguém vai cair
Só mais uma vez que vês que ninguém está aqui
Queres só mais uma volta desta ninguém vai cair
Tempo frio afasta o tempo que nos afastou
Primavera lança o laço que nos amarrou
Tempo quente dá vontade de não resistir
Vai só mais uma volta desta ninguém vai cair
E ainda te sinto a seguir o rasto que deixo a correr
Ainda penso em ti... pensa em mim, mas só mais uma vez.
Diz-me ao que queres jogar que eu vou querer também
Diz-me quanto queres de mim para te sentires bem
Não te vejo bem ao longe não sei distinguir
Queres só mais uma volta e desta ninguém vai cair
Ainda te sinto a seguir o rasto que deixo a correr
Ainda penso em ti... pensa em mim, mas só mais uma vez.
Diz-me quanto tens de honesto quanto tens de bom
Diz-me quantas provas queres diz-me quanto sou
Já não sinto nada dentro não sei perceber...
Vai só mais uma volta, desta ninguém vai dizer.
Ainda te sinto a seguir o rasto que deixo a correr
Ainda penso em ti... pensa em mim, mas só mais uma vez.
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