24 setembro 2008

Previsão do tempo num litoral incerto

Fotografia de Nuno Abreu


Anunciam-se chuvas,
que cairão formosas e seguras
sobre os telhados que de vidro forem.

Os outros, que de vidro não são,
podem ficar sossegados,
porque sobre eles as chuvas também cairão.

Anunciam-se ventos,
enlaces, casamentos,
festas de despedida
e rituais de iniciação.

Prevê-se a queda de pedras
vindas de todas as veredas
em movimentos antigos
de pura e total condenação.

Caída a noite as ondas
atingirão, animadas
os transeuntes desprevenidos
e escondidos na escuridão.

Madrugada fora naufrágios,
maremotos, maus presságios,
subida da temperatura e geadas:
Esta é a minha previsão.

Carmen Zita Ferreira
in Poiesis XVI - Antologia de Poesia Portuguesa Contemporânea.
Ed. Minerva, Lisboa, Junho de 2008, pg.48

2 comentários:

Susana Júlio disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Susana Júlio disse...

Não trago guarda-chuva sequer Guardo o sol
Sou o baú sem dimensões e sem profundidades
Que abarca todas as previsões
No apetite voraz da imperfeição
Do desejo de saber mais
Da vontade de crescer turbilhão
Na sequela das palavras de vidro
Que descendem desses mesmos telhados

Sou a vizinha das tempestades
E anuncio aqueles que anunciam

Trago a antiguidade no sabor das letras
De cada vez que as mesmas se articulam
Em danças macabras

Visto a noite a cada saída de mim mesma
Enquanto despenteio todas as estrelas que se choram perdidas
Sou canto e sou prece em terras de devastação
Sou mais um cavaleiro do Apocalipse
Que se desviou da sua rota

Resgato os náufragos do húmus da Vida
E semeio as almas aos pés das árvores cantantes:
Nascemos delirantes
Pensando ser mais
Do que nos foi dado SER!