03 março 2008

Multidão

Fotografia de Pedro Noel da Luz
http://olhares.aeiou.pt/petrosdune


Multidão

Correm, com passos de gente que se atrasa,
olhando o relógio, para a hora do suicídio.
Correm, sob um sol que queima, abrasa,
num torturar inquieto, novo e antigo.

Esbarram nos vultos que com eles se cruzam,
fazendo parte de uma multidão sempre igual.
Esbarram e quase nunca se olham
temendo a pausa que impõe o reconhecimento do mal.

Parar é morrer e perder o barco
que nos leva à margem onde o suicídio é feito,
onde com a morte fazemos a cada dia um pacto.

E assim vamos correndo com pressa, na solidão
que marca a diferença no meio de tanta gente
que corre, todos os dias, para ganhar um pedaço de pão.


Carmen Zita Ferreira
in Jogo de Espelhos,
Ed. Som da Tinta, 2004, pg.33

Sem comentários: